À mesa

Henri Matisse :: La Desserte (Harmonie Rouge) :: 1908 :: ©hermitagemuseum.org

 

O ser humano talvez já nem se lembre de que o vestir teve, um dia, um significado apenas funcional em sua vida – proteger o corpo das intempéries. Passado esse primeiro e longínquo momento, no decorrer dos séculos o vestir foi incorporando outras significações – sociais, religiosas, ou mesmo ideológicas e políticas – até se tornar, como é hoje em dia, um ato carregado de códigos, rituais e cuidados.

 

Em relação ao comer, a história não difere muito – se o alimento teve, um dia, função apenas de garantir sobrevivência ao ser humano, com o passar do tempo ganhou desdobramentos e, permeado por questões econômicas, sociais, religiosas ou geográficas, o alimentar-se também adquiriu seus códigos, rituais e cuidados.

 

Ao olharmos essa evolução de modos e costumes, podemos ainda observar um outro aspecto, mais sutil e não menos relevante: a necessidade do ser humano de conferir maior prazer a atos que, por essenciais à sua própria existência, lhe são obrigatórios. À medida que o homem adquiriu consciência de sua própria existência e percepção de seus gostos e prazeres, não lhe foi mais possível suportar a infinita repetição, mecânica e cotidiana, de afazeres que não propiciassem conforto também à sua alma. Ampliar o sentido desses afazeres tornou-se necessidade imperiosa.

 

A quaisquer atos e realizações do ser humano, bem como às diversas maneiras de nos relacionarmos com eles e entre nós mesmos, podemos conferir beleza e, por decorrência, propiciarmo-nos prazer. Na introdução de seu livro ‘A beleza salvará o mundo’ (Ed. Difel, 2011), o filósofo Tzvetan Todorov explica que a beleza, seja a de uma paisagem, a de um encontro ou a de uma obra de arte, não remete a algo para além dessas coisas, mas nos faz apreciá-las enquanto tais – e, assim, nos permite experimentar a sensação de habitar plena e exclusivamente o presente.

 

Estar à mesa para desfrutar de uma refeição é uma das mais frequentes e ricas oportunidades que temos de experimentar tal sensação – e é espantoso ver quantas pessoas a desperdiçam diariamente, se relacionando com o alimentar-se como o faziam aqueles nossos ancestrais.

 

À mesa, a forma dos objetos dispostos, o paladar de um certo alimento, o encontro com o outro, ou o encontro consigo mesmo, tudo são possibilidades de desfrutarmos dessa plenitude – no dizer de Todorov, ‘sensação fulgaz e ao mesmo tempo infinitamente desejável, pois graças a ela nossa existência não decorre em vão; graças a esses momentos preciosos, ela se torna mais bela e mais rica de sentidos.’

 

Sejamos, pois, atentos e generosos conosco mesmos, lembrando diariamente que cada refeição representa uma chance de nos encontrarmos com o belo, de conferir prazer a nós mesmos e, assim, de ampliar o sentido de nossa existência.

Aforismos contemporâneos

Mira Schendel :: sem título (da série ‘Escritos’) :: 1965 :: ©moma.org

 

Pequenos esclarecimentos àqueles homens e mulheres adultos, bem nascidos, bem nutridos e tão abastados quanto mal criados, que a cada dia permeiam mais o cotidiano urbano. (A propósito de uma conversa que, particular que seria, em ambiente social me foi impingida aos ouvidos pelas centenas de decibéis com que emanava).

 

Ser não é sinônimo de ter.

 

Bolsa não é troféu.

 

Sapato não é pedestal.

 

Sala de cinema não é parque de diversões, e mesa de restaurante não é tribuna.

 

Intervenção estética não é assunto de utilidade pública.

 

Crachá de empresa não é medalha de honra ao mérito.

 

Os conceitos de ‘exibição’ e ‘elegância’ são excludentes quando aplicados a pessoas.

 

Pode-se converter identidade em imagem. O inverso, porém, não é verdadeiro.

 

Cada personal contratado é uma incompetência assumida.

 

Decote e comprimento de saia (ou vestido) crescem em proporção direta. Nível alcoólico e adequação, em inversa.

 

Presença de palavrão significa ausência de vocabulário.

 

É preciso ser bonita(o) para ser modelo, mas não é preciso ser modelo para ser bonita(o).

 

O uso de gentileza e cortesia não guarda relação de proporcionalidade com o nível socioeconômico do interlocutor.

 

Em tempo:

 

Elegância: sf. ‘distinção de porte, de maneiras, garbo’. XVI. Do lat. elegantia –æ: requinte, bom gosto, asseio, beleza de formas.

 

Elegante: adj. ‘belo de formas, cuidado no trajo, educado, polido’. XVI. Do lat. elegans –antis: que sabe escolher, bem escolhido, distinto, esmerado, conveniente, honrado.

Distinção: sf. ‘discriminação, separação, diferença’: discrimen, -inis, separatio, distinctio, discretio. XVI. Do lat. distinctio –onis.

A alma imoral

Clarice Niskier em A alma imoral :: photo Dalton Valério

 

‘Há um olhar que sabe discernir o certo do errado e o errado do certo. Há um olhar que enxerga quando a obediência significa desrespeito e a desobediência representa respeito. Há um olhar que reconhece os curtos caminhos longos e os longos caminhos curtos. Há um olhar que desnuda, que não hesita em afirmar que existem fidelidades perversas e traições de grande lealdade. Esse olhar é o da alma.’

 

‘A alma imoral’ é uma das mais belas e impactantes peças de teatro dos últimos anos – uma adaptação teatral elaborada e interpretada (de forma elegante e sensível) por Clarice Niskier, a partir do livro homônimo do rabino Nilton Bonder. Partindo do conceito de que, por sua própria essência, a alma humana é transgressora, o texto confunde, desconstrói e reconstrói visões milenares sobre o que sejam corpo e alma, certo e errado, obediência e desobediência, traído e traidor.

 

Bonder coloca a tomada de consciência do ser humano sobre sua própria existência como a origem do corpo moral, que passa a ser o guardião dos costumes, da conformidade e da adaptação – o mantenedor das tradições do passado, que por meio delas colabora para a reprodução da espécie. Já a alma – que carrega em si a rebeldia e a capacidade da mutação – é aquela que possibilita pensamentos e condutas que rompem com essa moral estabelecida, colaborando assim para evolução dessa espécie. Para ele, é a tensão gerada por essas duas naturezas conflitantes e interdependentes, e o diálogo que se constrói entre essas forças – a conservadora e a transgressora – que permite ao homem transcender a si mesmo.

 

‘Não há tradição sem traição. E não há traição sem tradição.’ Basta olhar para a história da humanidade para constatarmos, nas mais diversas formas da expressão humana, a beleza e a verdade dessa afirmação: de Michelangelo a Picasso, de Beethoven a Stockhausen, de Isadora Duncan a Pina Bausch, de Brunelleschi a Frank Gehry, de Shakespeare a Guimarães Rosa… a evolução humana depende fundamentalmente de atos que, pela ótica dos costumes e da tradição, são vistos como traições. Mas verdadeira traição seria não dar voz a nossas almas transgressoras, pois são elas que nos permitem o prazer e a evolução em nossa existência.

 

Sobre a peça: www.almaimoral.com

 

‘A alma imoral’, Nilton Bonder, 1998, Ed. Rocco.

 

 

A força e a beleza das palavras

Jenny Holzer :: Xenon on Berlin’s Matthäikirche :: 2001

 

Nascida em Ohio, em 1950, Jenny Holzer é uma artista que ao longo das últimas décadas vem consolidando um lindíssimo e impactante trabalho nas artes visuais. Embora tenha navegado pelo abstracionismo no início de sua carreira, quando se mudou para New York Holzer elegeu a palavra como força motriz de sua obra, e passou a se utilizar de mídias não convencionais, como outdoors, painéis de LED e projeções luminosas, para fazer chegar ao espectador as duas dimensões que compõem uma palavra: a forma e o conteúdo.

 

Os textos de que faz uso têm as mais diferentes origens: muitos são seus próprios escritos, outros são poemas internacionalmente conhecidos, outros ainda têm como fonte documentos governamentais. Mas Holzer se utiliza dessa diversidade para trabalhar  em uma vertente única, que fala de valores universais e estabelece conexões que tocam profundamente a todos nós: o público e o privado, o corpo político e o corpo físico, o global  e o particular.

 

Mais impressionante, porém, é o contraponto que Holzer constrói, em cada obra, entre forma e conteúdo: vemos, ao um só tempo, sensibilidade e força, gigantismo e fluidez, efemeridade e perenidade – tudo isso com um resultado plástico de beleza indiscutível.

 

Frente a uma obra de Holzer, não há como ficar indiferente. A força de sua palavra invade, da forma mais bela, nossos olhos, nossa mente e também nossa alma.

 

Para saber mais: www.jennyholzer.com

 

 

Múltiplas escolhas

Pantone guide :: ©Pantone.com

 

Catálogos referenciais vêm sendo utilizados desde o século XVI como instrumentos de trabalho por todas as áreas das artes decorativas. Tendo como finalidade experimentação, documentação, comercialização ou divulgação, são peça dotadas de uma beleza muito particular pois, reunindo inúmeras possibilidades de cores, desenhos, formas ou texturas, trazem aos olhos a percepção da variedade – e, fazendo-o dentro de certa ordem criteriosa, possibilitam relfexão, compreensão e prazer. (Citando Montesquieu: ‘Não basta mostrar muitas coisas à alma: é preciso fazê-lo numa ordem, pois assim nos lembramos do que vimos e começamos a imaginar o que veremos; a alma assim se felicita por sua amplitude e sua capacitade de penetração.‘)

 

Sobre esse tema, em 2008 o Cooper-Hewitt Museum exibiu uma belíssima exposição chamada ‘Multiple Choices – From Sample to Product’ (‘Múltiplas Escolhas – Do Modelo ao Produto‘). Os itens expostos iam de catálogos de vendas com modelos de botões de uma indústria francesa no século XVIII, passando por placas cerâmicas com referências das cores das porcelanas de Sèvres, até os atuais Pantone® Guides – cadernos, livros e objetos de beleza ímpar, capazes de encher os olhos e tirar o fôlego.

 

O contato com o universo de cores, formas e suas infinitas associações é uma experiência multisensorial capaz de produzir os mais diferentes efeitos sobre nós. Resultantes das diferentes reflexões da luz que incidem sobre um objeto e chegam a nossos olhos para então serem decodificadas pelo cérebro, as cores provocam diferentes estímulos e sensações. Um mesmo elemento, bi ou tridimensional, que nos seja apresentado em diferentes cores terá sobre nós efeitos diversos – da alegria à tristeza, da calma à excitação. Um belo exemplo disso é o PantoneHotel, inaugurado em 2010 em Bruxelas. Convidando a ‘experimentar a cidade por meio da lente das cores’, o hotel atribuiu a cada um de seus 7 andares diferentes paletas cromáticas, objetivando assim proporcionar a seus hóspedes diferentes sensações – nesse caso, cuidadosamente estudadas para se converterem em diferentes prazeres.

 

Saiba mais em:

http://www.pantonehotel.com/

O planeta blue na estrada do sol

 

Esse é o título de um show acústico que Milton Nascimento apresentou no Teatro de Cultura Artística, em São Paulo, em outubro de 1991. Foram apenas 3 apresentações que, gravadas, deram origem a um álbum de mesmo nome, infelizmente muito pouco conhecido do público e, hoje em dia, fora das prateleiras e das plataformas de streaming.

 

Na maioria de seus trabalhos, Milton sempre privilegiou a interpretação de suas próprias composições. Nesse, diferentemente, coloca-se como intérprete, cantando e tocando (violão, piano e sanfoninha) canções de outros compositores – das 11 que compõem o cd, apenas quatro são de sua autoria. E é nessa surpresa que reside um enorme encantamento.

 

O cantar de Milton transcende qualquer expectativa. Músico de sensibilidade ímpar e dotado de uma voz cristalina, suas interpretações são tão apaixonadas quanto apaixonantes. Com total domínio técnico e extrema propriedade no uso da emoção, Milton faz emergir, de maneira surpreendente e arrebatadora, a essência de cada composição. Como resultado, nos chegam  como inéditas canções que antes julgávamos conhecidas.

 

O que canta em Milton não é apenas sua voz – é, sobretudo, sua alma. E cada palavra que ele entoa chega também à nossa alma, na exata medida do prazer que uma canção pode e deve proporcionar às pessoas.

 

Para degustar: Hello Goodbye (Lennon & McCartney)

Por que Chanel

Coco Chanel :: ©Chanel.com

 

Quase 100 anos após suas primeiras criações, Chanel ainda é reverenciada no mundo da moda – e também fora dele. Numa era em que produtos, pensamentos e relações são cada vez mais efêmeros, há de se pensar sobre o porquê dessa longa permanência.

 

Libertando a mulher dos trajes rígidos do final do século XIX (que privilegiavam a ostentação em detrimento do conforto), Chanel reproduziu, em escala industrial, sua própria imagem – uma imagem diferenciada, em absoluta sintonia com sua personalidade e com o momento histórico em que vivia. E nisso reside o segredo de sua permanência no imaginário coletivo por todo esse tempo: não somos fascinados por suas roupas, seus colares ou seu perfume – somos fascinados por sua identidade, tão forte quanto única, e que nos é revelada por meio dos objetos que usou e (re)produziu.

 

Dizem que a intensidade da presença de Chanel anulava a de suas rivais. Mas sem dúvida  tal fascínio não vinha dos objetos que escolhia para seu vestir… esses eram escolhas pessoais e conscientes, decorrentes da intensidade de seu pensar – e do entendimento de que, também pelo vestir, expressava a própria identidade.

 

Ironicamente, a produção industrial de um estilo pessoal e único tornou-se um paradoxo – a ponto de a própria Chanel, a certa altura, ter afirmado: ‘Já não sou o que era: devo ser o que me tornei.’ A ânsia por uma imagem socialmente reconhecida e valorizada, aliada à falta de conhecimento e de reflexão sobre si mesmo, faz hoje com que milhares de pessoas creditem a bolsas, sapatos e roupas a capacidade de lhes conferir personalidade e identidade, numa total inversão de papéis.

 

Como já escrevi no texto ‘Do vestir’ (jan, 2011), o belo está em sermos e sabermo-nos únicos. Belo, portanto, não é ter Chanel – belo é ser Chanel.

Feitiço

 

‘A cidade enfeitiçada’ foi a primeira música de Paulo Gusmão que ouvi. Tal foi meu encantamento – pelo título inspirador, pela composição sublime e por seu arranjo tão sofisticado – que logo decidi buscar informações sobre o compositor que até então desconhecia.

 

O título da música batiza também seu respectivo álbum – uma ode ao Rio de Janeiro, lançada em 2009. Não menos inspiradores são os títulos das outras faixas que ali encontramos: ‘Flor de outono’, ‘O brilho do vagalume’, ‘Sua silhueta sutil’… sem falar em ‘Romance em Vila Humaitá’, delicadamente desmembrada em três atos. São quinze composições cativantes, que encantam e emocionam. Melodias e harmonias que chegam aos nossos ouvidos com leveza e suavidade, parecendo flutuar. Arranjos que estabelecem diálogos sutis entre sanfona, flauta, violão e outros instrumentos, como se cantassem uma história – e o ouvinte se sente imerso na atmosfera do cinema, invadido por imagens carregadas de graça e elegância.

 

Nascido na capital paulista, Paulo iniciou-se na música aos quinze anos. Estudou violão, guitarra, piano, flauta, baixo elétrico e canto, além de ter se dedicado também a percepção, harmonia, arranjo e orquestração. Instrumentista e compositor, já teve suas composições interpretadas por diversos corais, grupos, orquestras e bailarinos. Seu mais recente trabalho, lançado em 2020, o compositor volta à Cidade Maravilhosa, reafirmando sua personalidade em narrativas que sopram como a brisa – evoca Tom Jobim, a leveza tropical, amores românticos, encontros e despedidas, musicando lindamente o que diz o título do álbum: ‘O tempo que foi’.

 

‘A cidade enfeitiçada’, e toda obra de Paulo Gusmão, são o próprio feitiço – um encanto irresistível, magnético, fascinante. Música instrumental brasileira e contemporânea de altíssima qualidade, que toca o ouvido com doçura, a alma com beleza, e nos enche de imenso prazer.

 

Para conhecer e ouvir: www.paulogusmao.com.br.

Fronteiras do design

Henzel Studio :: Olive Street nº4

 

Há objetos que, mesmo produzidos com alta tecnologia, segundo um projeto específico e em escala industrial, apresentam-se aos nossos olhos com a força das obras de arte, únicas e manufaturadas. Colocam-se na relação com o observador mais como ‘sujeitos’ do que como ‘objetos’, surpreendendo por sua originalidade, emocionando por uma beleza única e instigando por subverterem padrões existentes. Esses objetos nos tiram de uma certa zona de conforto e exigem de nós um novo olhar e uma nova reflexão sobre aquilo que pensávamos conhecer.

 

Os tapetes criados pelo Henzel Studio são assim – questionam, testam e transcendem fronteiras que, muitas vezes, ainda persistem entre design (nesse caso, de interiores) e arte. O ponto de partida é um novo olhar sobre esse objeto, tão conhecido (?) de todos nós… E o resultado é arrebatador.

 

Não há dúvida de que, sem excelência técnica e alta qualidade de materiais, seria impossível materializar em lã traços e cores que mais parecem ter surgido de pinturas, grafites e aquarelas. Mas se esses tapetes falam à nossa alma é porque, ainda antes da competência executiva, alguém se dedicou com alma a transformá-los em um novo meio de expressão. Para tanto, questionou o convencionalismo, subverteu padrões, usos e finalidades, e com isso redefiniu não apenas um novo universo de cores, imagens e tratamentos para esse objeto, mas também a relação que podemos estabelecer com ele.

 

Inquietude, inconformismo e paixão são ferramentas fundamentais para abrir mentes e corações, permitindo que nos lancemos ao novo. E toda alma precisa do novo – (re)descobrindo formas, cores, usos e relações, podemos criar e desfrutar, a cada dia, de novas fontes de beleza e prazer.

 

Para saber mais: www.byhenzel.com

Todos os sentidos

John Nouanesing :: Paint or dye but love me :: 2008

 

‘Paint or dye but love me’ é o título do surpreendente projeto-conceito de uma mesa desenvolvido em 2008 por John Nouanesing, designer de produtos que vive na França e se dedica prioritariamente ao design de mobiliário. O desenho lúdico da peça, com formas que parecem estar em constante ‘suspensão’ e um vermelho vibrante e muitíssimo intenso, cria uma forte tensão visual que, longe de provocar incômodo, coloca um sorriso no rosto do observador, despertando nele uma certa sensação de prazer.

 

Assim como em ‘Paint or dye but love me’, por meio de suas criações o designer parece querer contar uma história – uma narrativa que nos faça depreender claramente o caminho conceitual percorrido desde o insight até o resultado final do objeto. Nouanesing diz que seu processo criativo é guiado por três princípios: observação, inovação e irreverência. No entanto, além desses, também o princípio do deslocamento pode ser percebido em grande parte de seu trabalho: ao transferir para a mesa rígida e estruturada a tinta vermelha fluida e desforme, ou as lentes coloridas dos óculos 3D descartáveis, John Nouanesing provoca no observador novas sensações em relação a objetos que já fazem parte de seu repertório, conferindo a ambos – ao objeto pré-existente e ao objeto criado – uma mudança de percepção e uma ampliação de significado.

 

Em seu livro ‘Das coisas nascem as coisas’1, Bruno Munari diz: ‘Uma coisa que aprendi no Japão é justamente esse aspecto de projetar que leva em conta todos os sentidos do observador, pois quando ele se encontra perante o objeto ou o experimenta, sente-o com todos os sentidos.

 

Mesmo que os resultados plásticos não sejam sempre belos, e mesmo que muitos de seus  projetos sejam efetivamente inexequíveis, os exercícios a que John Nouanesing se propõem revelam total domínio da metodologia necessária à criação de um objeto. Além de observar, criar e inovar, ele nos convida experimentar de outras maneiras o mundo que já conhecemos. E assim, explorando nossos sentidos, nos proporciona a descoberta de novos e divertidos prazeres.

 

Para conhecer outros trabalhos do designer, acesse johnnouanesing.com.

 

 1. “Das coisas nascem coisas”:: Munari, Bruno :: Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1998, 380p